Último dia do mês. Último dia de trabalho. E um dia de coração partido.
Continuo sem saber qual vai ser o meu futuro no colégio. Se sou eu que vou ficar a ensinar o inglês do 1º ciclo também ou se vou apenas ficar com o pré-escolar. E esta incerteza está a causar-me uma angústia inimaginável.
Não consigo desligar-me das minhas crianças (já sabem que sou um coração mole), com as quais tenho uma ligação muito especial. E os pais sabem disso.
Não estou a conseguir cortar o cordão umbilical que só nos deveria separar quando eles saíssem do 4º ano. Como irão reagir as minhas crianças quando virem que não sou eu a dar-lhes aulas, a proporcionar-lhes aprendizagens brincando, e apanharem com um director que tem mais que fazer e que vai para ali despejar matéria como se eles fossem pequenos adultos? Isto é, se conseguir dar as aulas…
E não estou a inventar nada, estou apenas a reportar-me a relatos de alunos que o tiveram como professor. Pior ainda, não tem especialidade nenhuma para dar 1º ciclo e está desactualizadíssimo!
E ainda mais triste fico ao pensar na forte possibilidade de não ser eu a iniciar a minha priminha B. na língua inglesa, pois vai para o colégio este ano frequentar o 1º ano. A minha B. e todas as outras crianças que eu já conheço há muito e sempre estiveram muito ansiosas por aprender inglês comigo…
Como se não bastasse o desânimo que estas situações me vêm trazendo, recebi uma notícia de uma das minhas melhores amigas que me caiu como uma bomba.
Resolveu sair do actual emprego – onde estava a viver uma situação insustentável – para ir trabalhar para uma das regiões de França onde abunda gente VIP e com uma forte componente turística.
Mas o pior é que vai trabalhar para uns russos que não conhece e nem sabe exactamente o que vai fazer.
Já lhe disse que admiro a coragem dela pois eu não a tenho. Ir para um país estrangeiro sozinha, onde não tem ninguém conhecido e onde lhe arranjaram um trabalho. Sim, porque ela nem sequer falou com os futuros patrões. Isto assusta-me e muito. Mas eu sou um coração muito mole e jamais seria capaz de abandonar os meus pais velhotes para ir trabalhar para fora do país. E muito menos ainda sabendo que poderia nunca mais ver o meu pai ou a minha mãe devido aos seus problemas de saúde que implicam alguma gravidade.
Hoje é mesmo um dia para esquecer. Parece-me que a minha insónia desta noite estava já a indiciar-me alguma coisa. Ai este meu sexto sentido…!
Sinto-me cada vez mais desanimada e angustiada. Hoje foi um dos dias em que mais me enervei e estou aqui em frangalhos.
A miúda que veio ontem pela primeira vez consegue tirar qualquer um do sério. Eu e a minha auxiliar perdemos a compostura.
Comecei o dia com a Apitos - é assim que vai ser designada a partir de agora - e empurrar a bébé só porque a sua imaginação lhe disse que a pequenina lhe tinha mexido nos bonecos. O que vale é que a bébé é um amor e nem chora. Veio o histerismo do almoço e ao lanche aproveitou para dar uns murraços ao coleguinha com quem estava brincar. Não sei como o puto não caiu do banco abaixo. Ficou todo vermelhinho no peito e pescoço (zona dos murros) com lágrimas nos olhos e eu lá fui a velocidade luz buscar gelo.
Se voei para ir buscar gelo mais depressa coloquei a Apitos de castigo sentada num banco ao pé da porta. Desatou a berra como se não houvesse amanhã. Fui ao pé dela repreendê-la e ainda mais berrou. Como se a tivesse a matar.
Pensei como os meus botões: o melhor a fazer é ignorá-la para ver se se cala. Já disse que a Apitos tem a voz mais irritante ao cimo da terra?
Com tanta berraria, não é que a mulher da limpeza tema a lata, o descaramento, a ousadia de ir buscá-la ao castigo e pô-la no colo?!? Epá, saltou-me a tampa de novo e depois de contar até quinquilhões e três, pedi que sentasse a miúda no banco e que não voltasse a fazer aquilo.
Parece que este ano apenas irei dar aulas ao pré-escolar neste colégio. Acho que o boss vai voltar a dar aulas.
agora alguém me explica como se consegue gerir um colégio e dar 2 disciplinas e ATL? Quando sobra tempo para tratar dos assuntos inerentes a uma direcção?
E porque é que se desculpa do buraco financeiro com o facto de 3 colegas minhas subirem de escalão com têm direito, e logo terem um ordenado um pouco maior?
E porque é que é atribuída a indisciplina do 4º ano aos professores das AECs?
Talvez se não andasse no mundo da Lua e dos ideais utópicos, não investisse dinheiro em m€rd@s que não têm prioridade nenhuma, não empregasse um familiar próximo para lhe dar um 1º emprego e lhe pagasse um ordenado de licenciado sem fazer a ponta de um chavelho, se agarrasse o touro pelos cornos para tratar na origem os problemas de indisciplina, se abrisse os olhos quanto a quem trabalha naquele colégio e não fosse tão "narrow-minded" e estivesse abertos a novas iniciativas, o colégio não tivesse chegado a este ponto.
É muito fácil atribuir as culpas aos outros. É uma desculpa para os próprios erros. Sempre fiz tudo pelo colégio e a recompensa que tenho é esta. Espero que os pais abram os olhos e se mexam. Vamos lá ver se os pais são capazes de usar a força que possuem e se calhar não sabem que é tão poderosa...
Hoje sinto-me assim a modos que para o decepcionada, desiludida e com uma sensação de vazio.
Deparei comigo mesma a reflectir sobre a minha vidinha neste mês de Agosto e a sentir-me perfeitamente estúpida.
Levantar-me às 6.30, apanhar o autocarro – rezando fervorosamente para não o perder – chegar ao colégio super cedo, ir até ao café antes de entrar para fazer tempo (sim, porque há pais que ainda não está na hora de abrir o colégio já eles lá estão e eu detesto abusos), limpar as mesas com desinfectante – o que não me compete, mas enfim! -, começar a receber crianças, aturar fitas de crianças mal-educadas com o maior sorriso do mundo nos lábios quando a vontade real era dar umas palmadas nos rabos dos papás pois os meninos estão assim porque não lhes ensinam regras.
Depois vamos brincar para o recreio, segue-se a hora de almoço com as tradicionais fitas de “não gosto da sopa” ou então na variante “a sopa tem pêlos”. Fraldas mudadas, mãos lavadas, xixis feitos e ala pra caminha dormir a sesta.
Depois é a minha vez de fazer a minha hora de almoço. Que se pode fazer naquele tédio, numa zona tão mortiça? Continuar a trabalhar!
Lá pego eu nos meus livrinhos e vou tratar das planificações para o próximo ano.
Hora do lanche. Falta pouco para eu sair. Pego nas minhas coisas e vou apanhar o meu autocarro rumo a casa. E assim se passou mais um dia de trabalho chato e sem graça nenhuma. É que este ano nem actividades dá para fazermos com as crianças pois as disparidades de idades é muito grande e não me pagam para ser a mulher dos 7 ofícios.
É que aqui a parva já vai deixando de ser parva… um bocadinho… Se não sirvo para umas coisas também não sirvo para outras. I’ll tell you someday.
Regressei, dolorosamente, à minha vida activa. Ter que madrugar para voltar a entrar na rotina, dó muito até que volte a entranhar-se nos hábitos quotidianos.
A preguiça e a inércia só voltaram a passar por cá nas próximas férias de verão. Os seus serviços foram cessados... por enquanto!
A inspiração, essa, é que ainda não voltou das férias. É uma entidade privilegiada a quem foi concedida liberdade total, sem dia, hora ou local marcado para aparecer.
Talvez seja falta do contacto assíduo entre pale e caneta ou até mesmo entre o pc e o teclado.
Vou até ali espreitar por entre as árvores para ver se ela surge de algum lado...